quinta-feira, 21 de maio de 2009

Entre a cruz e a espada

Os livros do norte-americano Dan Brown parecem ter sido feitos para a tela grande. A narrativa que sempre apela para ganchos que atiçam a curiosidade e constrói momentos de tensão lembram muito o roteiro de um filme. Em “Anjos e demônios”, o desafio, portanto, era fazer do longa o mais próximo possível de uma continuação e não uma refilmagem do anterior, “O código Da Vinci”, já que os livros são praticamente idênticos.

Coube aos roteiristas David Koepp e Akiva Goldsman adaptar a obra tão recheada de personagens de personalidade dúbia, reviravoltas óbvias e teorias conspiratórias quanto a anterior. De quebra, em se tratando de um best-seller, a dupla ainda teria que tentar não matar de tédio o leitor da obra original, que já sabe de cor cada passo dos protagonistas.

A dupla de roteiristas optou, então, por uma série de mudanças na história que podem até desagradar os fãs, e que, de fato, surpreendem. As personagens e conflitos omitidos até que funcionam, pois o filme consegue prender a atenção até de quem leu o livro mais de uma vez. Ao contrário do livro, que custa a deslanchar, o filme economiza na teoria e parte logo para a ação. Tom Hanks é, novamente, o simbologista Robert Langdon. Desta vez, é chamado pelo Vaticano para impedir uma série de ameaças atribuídas ao Illuminati, uma sociedade secreta antiga formada por cientistas e intelectuais que combatiam os dogmas da Igreja Católica. O algoz promete matar a cada hora um dos quatro cardeais favoritos a sucessão papal e, para piorar, explodir toda a cidade sagrada com uma partícula de anti-matéria recém-produzida com o acelerador de partículas pela equipe da cientista Vittoria Vetra (Aylet Zurer), que auxilia Langdon a encontrar uma trilha de mais de 400 anos cujas pistas são monumentos pagãos do artista Bernini encontrados em igrejas de Roma.

O roteiro explora em diversos momentos o contraste entre ciência e tecnologia e religião, que é o centro da história, como nas cenas no Arquivo do Vaticano ou da chegada dos cardeais à cidade santa. O texto ainda consegue, de forma satisfatória, atribuir a outros as funções de personagens suprimidos, consertando falhas no texto de Dan Brown que tornaram a história mais verossímil, dinâmica e ainda mais tensa.

Com uma direção de arte rica em detalhes e fotografia que, juntas, ensaiam um passeio turístico pela capital italiana, a nova aventura de Robert Langdon chegou a sofrer represálias do Vaticano, mas acaba simpático à Igreja Católica, principalmente com a (feliz) mudança no final e com o destaque aos bastidores do conclave.
A direção insípida e tão criticada de Ron Howard não chega a incomodar, mas apenas cumpre seu papel. Howard até demonstra alguns momentos de inspiração, como as cenas no CERN e a morte do terceiro preferiti (a do fogo), mas deixa a desejar na direção dos atores. A morosidade de Tom Hanks e a interpretação insossa de Aylet Zurer não combinam com a correria frenética da narrativa. Por outro lado, o irlandês Ewan McGregor, como o camerlengo Patrick McKenna, assistente do falecido Papa que assume o cargo enquanto a vaga está desocupada, faz um trabalho mais convincente.

Já a edição e a trilha sonora, novamente assinada por Hans Zimmer, contribuem para a tensão criada pela corrida contra o tempo, bem melhor resolvida nas telas que no livro, onde se tem a impressão de que os minutos levam muito mais do que 60 segundos. “Anjos e demônios” não é um filme cheio de pretensões, a não ser a pura diversão, e aqui Howard se sai bem melhor que em “O código Da Vinci”, cuja narrativa proporcionava momentos enfadonhos. Talvez o grande mérito deste filme seja também seu grande pecado, pois, ao mesmo tempo que a fidelidade com o original tenha sido deixada de lado, o resultado acaba, sendo superior a obra em que foi inspirado, mas tão perecível quanto os papiros de Galileu.


FICHA TÉCNICA

Título: "Anjos e demônios"
Título original: Angels & Demons
País: EUA
Ano: 2009
Direção: Ron Howard
Roteiro: David Koepp e Akiva Goldsman, baseado em livro de Dan Brown
Elenco principal: Tom Hanks, Ayelet Zurer, Ewan McGregor, Stellan Skarsgård, David Pasquesi, Cosimo Fusco, Allen Dula.
Duração: 140 min.
Gênero: Suspense
Sinopse: O assassinato de um cientista faz com que o professor de simbologia Robert Langdon (Tom Hanks) e Victoria Vetra (Ayelet Zurer), filha do homem morto, envolvam-se com a sociedade secreta dos Illuminati. As pistas levam a dupla ao Vaticano, onde uma conspiração envolvendo o assassinato de cardeais, às vésperas da eleição do novo Papa, coloca-a em perigo.
Estréia: 15 de maio de 2009

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Alegoria carnavalesca e sem sal

Entre os mutantes X-Men, Wolverine é o que tem o maior número de fãs e cuja história tinha o maior potencial para um filme-solo. Enigmática, a origem do mutante das garras de adamantium nunca tinha ficado muito clara em nenhum dos três filmes da série, o que despertava a curiosidade dos novos fãs. O inevitável aconteceu e o mutante ganhou seu próprio filme nas mãos do diretor sul-africano Gavin Hood, que, pasmem, dirigiu o ganhador do Oscar de melhor filme estrangeiro “Infância Roubada” e ainda o irregular “O Suspeito”.

“X-Men Origins: Wolverine” (no original), porém, não cumpre nem passa perto da promessa. O filme, como obviamente o título sugere, tenta contar a origem do mais carismático e ranzinza dos X-Men, até o ponto em que começa sua história no primeiro filme dos mutantes. O longa começa com um rápido flashback da infância de pequeno Logan e de seu irmão mais velho e futuro rival Victor Creed, o Dente-de-Sabre. A cena, que funciona como prelúdio da saga, é piegas e de extremo mal gosto, principalmente quando o jovem Logan tem um acesso de raiva. Daí em diante, é ladeira abaixo.

Os irmãos, cuja relação é inicialmente harmoniosa, logo se mostram diferentes um do outro. A personalidade violenta de Victor (interpretado pelo insosso Liev Schreiber) acaba fazendo com que os dois conheçam o ambicioso coronel William Stryker, que está reunindo mutantes para montar um tropa de elite que vai defender interesses do governo norte-americano. Mas essa mesma brutalidade de Victor, incentivada por Stryker, leva Logan (vivido novamente pelo multimídia Hugh Jackman) a abandonar a equipe, o que acabou minando a estrutura do time. Anos depois, os ex-colegas de trabalho são vítimas de um assassino em série, e os irmãos se reencontram na tentativa de eliminar o tal matador.

Cheio de reviravoltas mais que previsíveis, falta cérebro ao filme de Gavin Hood, que não funciona nem como filme de ação. Com exceção do embate final entre Wolverine, Dente-de-Sabre e o mutante híbrido chamado de Arma XI (a X era o próprio Wolverine), as cenas de luta não conseguem criar a adrenalina típica e tão facilmente explorada pelos filmes do gênero. Nem mesmo a aparição de novos mutantes – uma tentativa de fazer deste um X-Men 4 – empolga. Remy LeBeau, o Gambit, coitado, que esperou quase dez anos para aparecer nas telas de cinema, só entra para ser humilhado por Logan. Faltou o dedo de Bryan Singer ou até mesmo de Brett Ratner, que fizeram bons trabalhos na trilogia X-Men. No fim, a instigante e obscura história da origem do mutante que, por um triz, não foi o líder do X-Men (como vemos no filme), apesar de esclarecida, ficou muito aquém do que merece o herói.


FICHA TÉCNICA

Título: "X-Men Origens: Wolverine"
Título original: X-Men Origins: Wolverine
País: EUA
Ano: 2008
Direção: Gavin Hood
Roteiro: David Benioff
Elenco principal: Hugh Jackman, Liev Schreiber, Danny Huston, Taylor Kitsch, Will. i. am., Dominic Monaghan, Ryan Reynolds.
Duração: 111 min.
Gênero: Ação
Sinopse: O longa conta a história do passado violento e romântico de Wolverine (Hugh Jackman), de seu complexo relacionamento com Dentes de Sabre (Liev Schreiber), e do ameaçador programa Arma-X. Wolverine encontra muitos mutantes pelo seu caminho, tanto familiares quanto novos, incluindo aparições surpresas de várias lendas do universo dos X-Men.
Estréia: 30 de abril de 2009