domingo, 8 de março de 2009

Muito barulho por nada

Adaptações de histórias em quadrinhos sempre rendem bons filmes. A interminável luta do bem contra o mal gera um sentimento de identificação universal que atrai milhões de espectadores e é garantia de renda alta para os estúdios. A expectativa em torno de “Watchmen – O Filme”, baseado nos quadrinhos de Alan Moore, não poderia ser diferente daquela vista com “Homem-Aranha” ou “Batman – O Cavaleiro das Trevas”.

É difícil falar de uma adaptação ambiciosa como essa – são doze volumes condensados em um longo filme com pouco mais de duas horas e meia – sem ao menos conhecer a obra que o originou. Para aqueles que desconhecem a história, o filme de Zack Snyder (o mesmo diretor de “300”) não diz a que veio.

“Watchmen – O Filme” deve agradar apenas aos fãs ou iniciados, ou ainda aqueles que vêem alguma graça em efeitos visuais exagerados e ensurdecedores. Com uma história confusa que não leva a lugar nenhum e momentos tediantes encabeçados pelo mutante Mr. Manhantan (vivido por Billy Crudup, a única personagem que faz algum sentido afinal, por mais fantasioso que seja), o maior erro do filme é não definir se os “heróis” tem ou não super-poderes. O excesso de efeitos visuais e o fetiche pelas lutas em câmera lenta, ao já saturado estilo "Matrix", colocam o espectador em dúvida acerca de origem das personagens. Depois de alguns flashbacks – recurso muito utilizado pelo filme para explicar fatos do presente – que tornam o filme uma colcha de retalhos, entende-se que, na verdade, os heróis são apenas humanos. Portanto, é constrangedor vê-los em fantasias esdrúxulas que os fazem parecer uma Liga da Justiça do Paraguai.

Para piorar, coloca os heróis em situações no mínimo embaraçosas – como na cena em que a capacidade sexual do Coruja (vivido por Patrick Wilson) é colocada em dúvida – na tentativa de nos fazer lembrar que são humanos. “Hellboy” traz heróis com problemas de relacionamento com um pouco mais de naturalidade. Como se isso não bastasse, a seleção musical, que vai de “Unforgettable” a “Hallelujah” (a mesma usada em “Shrek”), torna algumas cenas irritantes.

O filme começa com o assassinato do Edward Blake (Jeffrey Dean Morgan), conhecido como o Comediante, um dos membros do Watchmen, um grupo de vigilantes criado nos anos 1940 para combater gangues que atacavam usando máscaras que dificultavam a identificação dos bandidos. Como uma brincadeira de criança, os vigilantes, membros da polícia, resolvem se unir e defender a cidade também fantasiados.

Com a Guerra Fria e um fictício governo Nixon – olha ele de novo – como pano de fundo, a história tenta apelar para um niilismo que não convence, a não ser pelo desempenho de James Earle Haley, o Rorschach. Afinal, como já sabemos como termina o conflito entre os Estados Unidos e a União Soviética, o plano executado por Ozymandias (Matthew Goode), o homem mais inteligente do mundo, que acabaria de uma vez com todas as possibilidades de uma guerra nuclear, parece estúpido e infantil. Cheio de clichês do gênero, como o questionamento se cabe a eles ou não salvar o mundo ou ainda heróis-aposentados-que-voltam-à-ativa (o que “Os Incríveis” faz bem melhor), “Watchmen” acaba com uma referência explícita ao 11 de setembro, o que também já deu o que tinha que dar. Como diz o Comdeiante, é uma grande piada. Pena que muito sem graça.

FICHA TÉCNICA

Título: "Watchmen – O Filme"
Título original: Watchmen
País: EUA
Ano: 2009
Direção: Zack Snyder
Roteiro: David Hayter e Alex Tse, baseado em HQ de Alan Moore e Dave Gibbons
Elenco principal: Patrick Wilson, Jeffrey Dean Morgan, Billy Crudup, Matthew Goode, Carla Gugino, James Earle Haley.
Duração: 163 min.
Gênero: Ação
Sinopse: Ambientado numa realidade fictícia norte-americana nos anos 80, um grupo de super-heróis aposentados começa a ter sua vida ameaçada. Rorschach (Jackie Earle Haley), detetive que usa uma máscara desfigurada, e o Coruja (Patrick Wilson) passam a investigar a identidade do vilão antes que suas próprias vidas corram perigo.
Estréia: 6 de março de 2009

2 comentários:

  1. Bom, eu tenho algumas reservas com relação ao filme (a maioria com relação a forma como ele interpreta algumas coisas do quadrinho, como o final por exemplo), mas ainda assim gostei bastante do resultado final. Claro, não é a obra-prima que eu esperava que fosse (malditas expectativas! rs), mas também não é decepcionante 100%.

    Curiosamente vc apontou na sua critica algumas coisas que, na verdade, são o centro da história:
    1. o fato de não ficar claro se eles têm super-poderes ou não (com exceção do Manhattan nenhum tem).
    2. o fato deles serem colocados em situações embaraçosas.
    3. o fato de, mesmo não tendo poderes,eles se fantasiarem para "combater o mal".

    Bem, como alguém que leu a história antes do filme, sinceramente não tenho como responder objetivamente se ficou claro ou não NO filme todas as questões levantadas nos quadrinhos por esses fatores que eu enumerei. Tomando sua opiniao como a de alguem com o um bom discernimento cinematografico (que moral, hein... rs) aparentemente todas as questões ESTÃO LÁ, mas talvez as entrelinhas dos quadrinhos sejam mais visíveis.

    Outra coisa que vc escreveu e q tb já ouvi por ai me faz pensar sobre a questão de como contextualizar o filme. Vc citou Os Incríveis, mas poderia tb ter citado a série Heroes e tb outros produtos midiaticos que "beberam na fonte" dos quadrinhos Watchmen (lançados em 86). Na real, ao adaptar um quadrinho tão influente, como vc foge disso? Não dá pra mudar a história. (Um pequeno parenteses sobre o assunto:
    nos quadrinhos o Rorscharch mata o estuprador de forma diferente. Pq eles mudaram? Bom, pq Jogos Mortais copiou o metodo que Rorscharch usou nos quadrinhos, oq infelizmente tiraria a força da cena no cinema).

    Além disso, a propria HQ foi concebida como peça de desconstrução de paradigmas clássicos da literatura sobre super-herois e, de certa maneira, da própria "mídia" quadrinhos. Vc pode encontrar nela praticamente tudo q já foi feito na área. Ou seja, no final das contas vc tem nas mãos uma colcha de retalhos que, apesar de não formarem uma paródia, trabalha com varios universos conhecidos oq pode gerar a sensação de "já fizeram isso antes e melhor" que vc parece ter sentido.

    Enfim, é isso.

    abs.

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  2. Lembrei de outra coisa.

    O "questionamento se cabe a eles ou não salvar o mundo" q vc identificou como clichê, na verdade é basicamente a questão moral fundamental em qualquer história sobre heróis. Não dá pra fugir dela. É a pedra base de qualquer historia desse tipo.

    Sem esse questionamento o gênero fica superficial demais.

    O que dá pra questionar é se o filme trabalha direito esse ponto. E aí, até concordo que ele deixa a peteca cair em alguns pontos, mas de modo geral funciona. Eu acho.

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